A dança

Eu nunca soube dançar a dois. Sempre quieto e na minha, observava as pessoas em suas danças, girando, pulando e fazendo movimentos que eu só via na minha cabeça.
Eu nunca soube dançar a dois, no entanto, a sós eu era o próprio rei do pop. Dançava e me libertava, ao modo platônico da dança, enquanto fazia minha apresentação, olhava nos olhos daquela que me fazia querer dançar a dois. Enquanto me via dançando e encantando, sentia forte em mim a vontade de dançar a dois com ela. Como em Dirty Dancing, aguardava pelo o momento derradeiro em que eu a pudesse erguer, porém, Baby estava longe.
Observando as pessoas dançando, percebia que havia um revezamento constante em quem conduzia. Era interessante, pois, mesmo que muitos ali soubessem dançar(e muito bem, até pareciam mestres nisso), por vezes, deixavam de guiar e seu parceiro então, a seu jeito(com alguns problemas aqui e ali, talvez insegurança, estar com alguém que leva uma dança tão bem, exigia que fosse retribuído da mesma forma). A questão era, todos ali sorriam e dançavam, independente de quem conduzia, a sintonia e harmonia da dança se mantinham, mesmo que levasse um tempo.
Me vi nesse salão sozinho, no meu canto eu deslumbrava todos que podiam dançar, ficava feliz. Olhei mais ao fundo, tirei minha visão daquilo e olhei para ela, senti em meu peito que não queria mais só olhar, eu queria dançar, colocar para fora todos o passos que sempre imaginei, misturar Bolshoi com Cirque du Soleil. Queria aprender a dançar, com ela. Me levantei e caminhei até o meio do salão, olhando fixamente para aquela que aquecia meus pés, me fazia querer sapatear e chamar a atenção do mundo. Parado no meio do salão, estiquei minha mão em rumo dela e com um sorriso tímido a convidei. Metade do caminho havia sido feito, geralmente se vai até quem você quer dançar e a tira para tal, não nessa dança, essa requer esforço de ambas as partes, o meu havia sido feito, não a poderia forçar a nada.
Todos me olhavam e encaravam, "O que esse sozinho faz no meio do nosso salão?" e "O lugar dele é junto dos outros que não sabem dançar!", coisas desse tipo eram ditas por grande parte daqueles que me olhavam. Olhando para ela eu me sentia nervoso, não sabia se ela iria vir, via que estava hesitante, talvez alguém tivesse feito isso a ela no passado e trocado de parceira ou até mesmo desistido dessa dança, eu entendia.
Os olhos de todos queimavam-me, eu havia sido ousado, muitos ali torciam para que ela viesse até mim, ninguém forçava nada, só observavam, como eu os observei. Meu peito ardia, talvez timidez, só agora viera a mim a consciência do que havia feito. Ninguém mais dançava, me senti mal por ter causado isso, queria tanto fazer parte da dança e não para-la. Ela ainda permanecia sentada, meu coração batia mais rápido, olhei a minha volta e olhos tristes agora pairavam sobre mim, eu tive a certeza. Virei-me e vi meu lugar, ali como que me esperasse e dissesse que eu e ele ficaríamos unidos. Foi o que fiz, voltei para minha cadeira e dessa vez não me sentei, a peguei e voltei para o meio do salão, todos estavam dançando, porém, me olhavam, eu não me importava. Dancei com minha cadeira de parceira, eu dancei!
Me vi ali, feliz, passos para cá e passos para lá, pulei e realmente tentei imitar o rei do pop, sem sucesso, contudo, feliz.
Eu ia do tango ao frevo e na minha felicidade fazia uma espécie de a dança da cadeira. Nunca fomos tão felizes...
Seguindo meu exemplo, todos os outros que estavam no lado escuro do salão se mostraram e com suas cadeiras passaram a dançar e o mais legal de tudo é que, depois que todos passaram a dançar, "Os sozinhos" dentro do salão deixaram  suas cadeiras e uniram-se, como se seu pares estivessem tão próximos de si que só não os viam porque olhavam para aqueles que estavam a dançar.
Ao fundo, ela continuava lá, a única sentada. Como eu disse, eu entendia, mas assim como a minha atitude desencadeou o encontro de muitos, talvez ela precisasse de mais, então fui até ela, quebrei as regras dessa dança e fui tirá-la de fato para dançar, o que eu tinha a perder?
Deixei minha cadeira no meio do salão e fui até ela, nos olhavamos sem demonstrar emoção, da minha parte pelo o menos fingia, não queria assusta-la. Estiquei minha mão a ela e esperei, ela hesitava novamente em responder, eu conseguia ver uma vontade enorme de fazer parte daquela dança, mas, mais uma vez, eu compreendia. Talvez eu estivesse fazendo as mesmas coisas que o último que há havia tirado para dançar. Não teria como eu saber e fazer diferente, então, eu só sabia que queria fazê-la acreditar novamente naquela dança, mesmo que no fim, eu não fosse o parceiro. Apenas um problema nisso tudo, eu estava tentando acreditar também.
Voltei até o salão e peguei minha cadeira e trouxe de volta para perto dela, eu não sabia o que estava fazendo. Sentia seus olhos me olhando, curiosa.
Coloquei minha cadeira junto a dela e pedi para que ela se levantasse, deixei claro que não era para dançar, apenas para mostrá-la uma coisa.
Ela se levantou e então eu apontei para as nossas cadeiras juntas, unidas. Apontei depois para todos no salão, ela olhou e não entendeu de imediato, apontei por último para as cadeiras dos outros, a grande parte espalhada, enquanto todos dançavam. Era difícil saber qual cadeira era de quem, algumas outras estavam como as nossas, juntas. Ela olhou para as nossas, as dos outros e todos que dançavam e depois de um tempo ela sorriu e dessa vez ela me tirou para dançar. Eu sentia um pouco de nervosismo da parte dela, eu sentia isso em mim também, mas, ela agora sorria e aquilo me encantava. De maneira tímida iniciamos nossa dança, a gente ria com o erro um do outro, as vezes um pisão e uma escorregada, a gente estava aprendendo essa dança, nos dois conduzimos, afinal, ambos estavam acreditando e vivendo algo novo, então iriamos aprender juntos. Contudo, sabíamos onde nossas cadeiras estavam, caso precisassemos sentar e recuperar o fôlego.
Eu nunca soube dançar a dois, mas nunca deixei de dançar sozinho, afinal, essa dança não significa que somente possa ser dançada com alguém(por mais que assim seja mais prazeroso), mas caso não tenha um parceiro, vá com sua cadeira, dance feliz e jamais esqueça dela.

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